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É Desporto

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23 de Maio, 2017

FC Porto não sabe perder e isso tem tanto de bom como de mau

Rui Pedro Silva

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Nuno Espírito Santo seguiu Julen Lopetegui e Paulo Fonseca no caminho em que se sai do Dragão pela porta pequena. Pinto da Costa está a atravessar o pior momento da sua era e não há nenhuma fórmula antiga que se possa repetir. É esse o problema. 

 

Como reagir a uma situação inédita?

 

Qualquer pessoa que nasceu desde a década de 70 está habituada a que o FC Porto seja a maior potência futebolística nacional. De Pedroto a Vítor Pereira, os dragões foram tendo momentos menos felizes, mas o panorama geral raramente esteve em causa.

 

É o período áureo de Pinto da Costa. Um período em que conceitos como balneário unido e fechado contra os ataques exteriores e a estrutura sólida se tornaram elementos constantes no léxico futebolístico.

 

O FC Porto esteve na vanguarda do futebol português moderno. Fiel a uma estratégia, os dragões somaram triunfos atrás de triunfos. Aproximaram-se perigosamente do número de títulos de campeão do Benfica, chegaram a superá-lo em títulos totais e juntaram a glória europeia – uma Taça dos Campeões Europeus, uma Liga dos Campeões, uma Taça UEFA e uma Liga Europa – à hegemonia nacional.

 

As vitórias foram tantas que o clube deixou de saber como perder. Nos últimos trinta anos, apenas por uma vez, entre 2000 e 2002, a equipa das Antas tinha estado mais do que uma época sem ser campeão. Foi a ressaca do penta, seguida de títulos históricos de Sporting (18 anos depois) e Boavista (inédito) e de uma época em que Mário Jardel e João Vieira Pinta levaram os leões às costas até a um novo título.

 

Por cada título perdido, o FC Porto sentia-se ameaçado e reagia agressivamente. Parecia haver uma fórmula de sucesso infalível, capaz de inverter imediatamente a mesa do futebol nacional. Maior vontade do que continuar a saciar a fome de vitórias – como aconteceu durante o penta – só mesmo a obsessão com o regresso aos títulos.

 

O melhor exemplo surgiu mesmo após o hiato de 2000-2002. Pinto da Costa escolheu José Mourinho, ofereceu-lhe um plantel com inúmeras contratações internas e ficou para recolher os louros, com um bicampeonato, uma Taça UEFA e uma Liga dos Campeões.

 

Mesmo a ressaca desse período, naquele que terá sido a fase mais confusa dos dragões, com Delneri, Victor Fernández e Couceiro a demonstrarem que a noção de que qualquer treinador pode ser campeão no FC Porto não é assim tão verídica, foi terminada com o início de um tetracampeonato, para o qual contribuíram Co Adriaanse e Jesualdo Ferreira.

 

O que mudou?

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O FC Porto foi tricampeão nacional em 2013 no photofinish, por culpa de um golo de Kelvin nos descontos na penúltima jornada com o Benfica. Pareceu um pouco como Lineker parafraseado, em que quando interessa, os outros vacilam e os dragões prosperam.

 

Talvez por isso, um ano depois, o título do Benfica foi encarado com desdém. O termo «fim de ciclo» foi visto com desprezo. Pela primeira vez em muitos anos, os adeptos pareceram encarar o fim de ciclo como o fim da hegemonia e não como fim de uma série de títulos consecutivos.

 

O problema é que os próprios dirigentes do FC Porto reagiram da mesma forma. Com Paulo Fonseca e uma construção de plantel modesta, a mensagem que passou foi que a atitude faminta de outrora tinha sido substituída pela soberba do dominador.

 

Hoje, quatro anos depois, não dá mais para esconder. O FC Porto demorou a reagir e quando percebeu o que se estava a passar já foi tarde. E descobriu-se num terreno que nunca foi desbravado, numa situação inédita. Num contexto em que, por mais anos de experiência de Pinto da Costa e da sua estrutura, os dragões nunca tinham estado.

 

O FC Porto estava a perder como nunca em três décadas. A virtude de ter estado tanto tempo com tanto sucesso transformou-se num defeito de não saber como reagir, de não ter uma fórmula perfeita guardada numa gaveta para quando fosse necessário.

 

Sucessão de erros

 

A liderança do FC Porto não está a ser nesta década o que foi no passado. Ao longo dos últimos vinte anos, várias foram as vezes em que se decretou óbito à capacidade de decisão de Pinto da Costa. No passado, a ideia foi sempre precipitada. Agora, mais não seja por uma mera questão de idade (faz 80 anos em dezembro), o futuro está envolto numa grande incerteza.

 

Com a estrutura a tremer, antevendo a natural tempestade que acontecerá quando houver espaço para uma guerra sucessória, a estratégia do FC Porto tem sido instável. De uma aposta modesta com Paulo Fonseca, passou-se para um ambiente de tudo ou nada com Lopetegui, acabando numa ideia de prata da casa e orgulho dragão com Nuno Espírito Santo.

 

Nem mesmo Jorge Mendes, parceiro tão importante no passado, parece ter espaço garantido na construção do plantel, numa era em que a Doyen conseguiu aumentar a sua esfera de influência.

 

As consequências de tanta incerteza estão à vista: Paulo Fonseca conquistou a Supertaça no seu primeiro jogo, em agosto de 2014, e desde então não houve mais títulos. Fonseca, Luís Castro (de forma interina mas mais prolongada), Julen Lopetegui, José Peseiro e Nuno Espírito Santo tiveram oportunidades para isso mas fracassaram. Pelo caminho, ficaram foram dos dois primeiros lugares do campeonato em duas épocas, arriscando um fracasso financeiro ainda maior perante o fantasma do afastamento no play-off de acesso à Liga dos Campeões.

 

Caminho para o futuro

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Não há uma solução infalível para o FC Porto regressar ao caminho dos triunfos. E, se há, não serei eu a ter a poção mágica. Mas há pequenos detalhes que fazem a diferença, por mais que se pareçam a lugares-comuns, que têm de ser tidos em conta e respeitados.

 

O truque está nas escolhas. Pinto da Costa pode ter perdido o instinto ou estar simplesmente a deixar-se influenciar mais do que no passado mas, mais do que nunca, é fundamental rodear-se de gente de confiança e encontrar um ponto de equilíbrio decisivo na composição da equipa técnica e do plantel.

 

Julen Lopetegui e Nuno Espírito Santo chegaram com o dedo de Jorge Mendes e fracassaram. Se chegar Marco Silva, como está a ser cada vez mais falado, poderá parecer que é uma jogada com a Doyen em plano de fundo.

 

Não existe problema com isso. Existe, sim, se a perspetiva que dominar a mente dos responsáveis portistas for a simples movimentação de grandes montantes com a hipótese de lucro no horizonte.

 

A estratégia de sucesso inverteu-se. O lucro financeiro tem de estar obrigatoriamente em equação mas sempre como consequência do sucesso desportivo. É aqui que entram as escolhas inteligentes para compor o plantel. De nada valerá comprar e vender Imbula pelo mesmo número de milhões de euros, se o jogador nada acrescentar em campo.

 

Os jogadores que custam milhões e chegam com um asterisco de promessa de saída pelo mesmo número de milhões caso algo errado aconteça devem ser substituídos por jogadores de qualidade que valerão ainda mais milhões depois de mostrarem o que sabem nas quatro linhas.

 

Acima de tudo, o FC Porto parece estar também a atravessar um problema de independência. Resta saber se Pinto da Costa conseguirá exercer o punho de ferro que tantas vezes mostrou no passado. Ou se, em fim de ciclo presidencial, estará já dependente do que os braços-direitos que vai encontrando arranjam para o clube.

RPS

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